Em celebração íntima e singular do meu
último aniversário um pensamento demorado me afetou. Tamanha a obstinação do
pensar, que ocorrestes a minha revelia (es
denkt). Ao alcançar trinta e quatro anos de vida, sem desconto ou
acréscimos, os limites da minha curta e limitada perspectiva de rã (Froschperspektive) ganhou asas (Vogelperspektive). Desvestida da pretensão
de promover julgamentos, apenas a título de pesquisa refleti sobre o ‘barato’
de viver camuflando a verdadeira idade. Que graça derramaria de uma felicidade tão
clandestina como esta? Bastaria uma escolha entre um punhado de certezas, ou um caminhão
de invenções? Até agora, pouco nos adiantou a manutenção de comportamentos
grisalhos e cheirando a mofo, que acabaram por nos confundir uns com os outros.
Aceito, assumo e agradeço minha atual idade, sem embargos ou judiciosos preconceitos
populares. Não mais permito que roubem a beleza discretamente contida no processo
de envelhecer. A fim de ocultar particulares coleções de idades, a longevidade ganhou
contornos deturpados, nocivos e covardes. Com efeito, a idade cronológica vista
por uma contagem de tempo vivido de maneira linear não poderia ser entendida
como um prêmio? O corpo por natureza não cobiça a longevidade? Nada obstante,
cabe a nós o respeito aos seus limites, necessidades e manutenção. Em sentido
histórico ansiamos por ideias com as quais podemos viver melhor, mas daí, disfarçar
uma abastada coleção de anos, francamente não me parece lá muito proveitoso. Com
todo respeito ao “refinado ateísmo”, acredito ser este o propósito da criação
divina, a vivência sob todas as etapas que a vida proporciona. Por pura
ambição, nem bem completei a nova idade, já recorro às orações pela graça de viver
o dobro de anos já somados. A saber, a velhice me acena com sorriso largo e
franco. Sabido o Frei Bernardino Leers, que nos alertou para os prazeres
contidos na contemplação do panorama de quem se encontra no alto da montanha da
vida. É de lá que espero registrar os
derradeiros capítulos da minha história. Livre da tortura de recusáveis des-ilusões. Ó Sancta simplicitas!
Referência:
NIETZCHE,
Friedrich. Além do bem e do mal: prelúdio a uma filosofia do futuro/ Tradução e
notas de Renato Zwick – Porto Alegre, RS: L&PM, 2012.