segunda-feira, 28 de maio de 2012

Nostalgia dos tempos em que bigode estava em alta







Em lembranças de um tempo não muito distante, o homem para manter sua honra imaculada precisava cumprir com a palavra empenhada. Nesta época, um único fio do bigode servia como garantia do cumprimento de pactos importantes. A expressão “fio do bigode” simulava o acordo firmado entre cavalheiros, sem assinatura de documentos ou qualquer outro ritual burocrático. Se acaso uma das partes se negasse a cumprir com o combinado, o fio do bigode do sujeito confirmava o (des)acordo como também identificava o malfeitor. Frei Bernardino Leers, ao propor uma profunda reflexão sobre o tal “jeitinho brasileiro”, algo intrínseco a nossa cultura, possivelmente percebeu a dualidade de propósitos entre ambos os conceitos. De um lado, “o fio do bigode” que representa a capacidade de pautarmos nossas atitudes por valores éticos como honestidade, integridade, lealdade, respeito e outros mais. Por outro lado, o “jeitinho brasileiro” acaba por eleger a vantagem como algo de importância maior. E assim, ora ou outra, nos deparamos com situações que se esgotam nesta encruzilhada de resultados tão distintos, a manutenção de uma reputação impoluta, ou a conquista de apropriada vantagem. Já nas esquinas dos nossos relacionamentos, lidamos constantemente com palavras proclamadas sem a real preocupação a respeito dos significados que carregam. A maioria das pessoas ignoram a miséria causada pelo desamparo aos seus pronunciamentos, o que acaba por ressignificá-las, à luz dos olhos de quem as enxergam. E a cada dia que passa se torna mais incomum a convivência com os tais sujeitos de “bigodes”. Desejo que nossos filhos e netos possam ouvir mais histórias sobre o Visconde de Mauá¹, homem que em grande parte de sua vida dividiu-se entre as atividades de industrial e banqueiro, contudo, morrera pobre aos setenta e seis anos de idade, com a sua moral ilibada.



¹Irineu Evangelista de Sousa nasceu em Arroio Grande, então distrito do município de Jaguarão RS, em 28 de dezembro de 1813. Órfão de pai viajou para o Rio de Janeiro RJ em companhia de um tio, capitão da marinha mercante. Aos 11 anos empregou-se como balconista de uma loja de tecidos. Em 1830 passou a trabalhar na firma importadora de Ricardo Carruthers, que lhe ensinou inglês, contabilidade e a arte de comerciar. Aos 23 anos tornou-se gerente e logo depois sócio da firma. Em 1845, Irineu tomou sozinho a frente do ousado empreendimento de construir os estaleiros da Companhia Ponta da Areia, com que iniciou a indústria naval brasileira. Devem-se a Mauá a iluminação a gás da cidade do Rio de Janeiro (1851), a primeira estrada de ferro, da Raiz da Serra à cidade de Petrópolis RJ (1854), o assentamento do cabo submarino (1874) e muitas outras iniciativas. Em 1875, viu-se obrigado a pedir moratória, a que se seguiu longa demanda judicial, derradeiro capítulo da biografia de grande empreendedor. Doente, minado pelo diabetes, só descansou depois de pagar todas as dívidas. Ao longo da vida recebeu os títulos de barão (1854) e visconde com grandeza (1874) de Mauá. O Visconde de Mauá morreu em Petrópolis-RJ, no dia 21 de outubro de 1889, ao lado da viúva e um, dos dezoito filhos que teve.